quarta-feira, julho 26, 2006

O GUARDADOR DE ROUPA



O guardador de roupa conheci quando voltei a fazenda anos mais tarde, a fazenda mudara, virara um simples sítio. O guardador era um armário velho. As crianças sempre um pouco perdidas, a avó morrera. Seguraram-me pelas mãos, me levando a um quarto escuro, o quarto da velha avó morta. “O vô não dorme mais aqui.” Tudo mudara tanto lá! Havia mais sol. Eles todos, os de minha idade foram embora. Eu voltava . Quando soltaram minhas mãos não notei na porta do armário o rosto que elas me disseram que viam.
Esqueci-me, pra constar: vai juntando ao som da fita cassete um som de asas se mexendo devagar, crescendo, crescendo, como para voar, mas sei que não dá para imaginar esses barulhos sempre, eles vem tão fortes em um só momento que se esquece deles muito, mas é trilha sonora que some e grita.
Lembrei: Sentado estava na cadeira perto da porta, estava todo arranhado, entrara na floresta. Ela me tocou nos braços, fez sinal de silêncio, “ eu não tô, diz que não tô!” falara alto, a pessoa que batia na porta sabia que ela estava ali, “fala que não tô!”, correu assustada, entrou no guardador de roupa,
--- Ela não tá!
Um dia alguém abriu a porta do guardador de roupa, a olhou, nada acontecia.
Agora que as crianças saíram do quarto. Escuro. Arrasto-me, se esgueirando, sento na cama e vejo dali a porta do armário, as manchas de madeira velha se juntam tão formadas. Um rosto de frente, magro, cor de madeira envernizada, um chapéu pequeno, um olhar expressivo, se não digo como era a culpa é minha. Eu vejo rostos e eles são mais vivos que a inexpressividade. Meu outro avô que sumiu logo depois se parece com meu pai e comigo. Eles aqui estão andando, quando seus pés sobem pra logo depois pisar o chão em passos rápidos dizem segredos que eu não entendo. Não junte esses passos com os barulhos de que falei, junte um ranger de guardador de roupa.

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